Falar sobre a realidade da economia Brasil e Argentina pode ser um tema bastante polêmico atualmente. Afinal, algumas mudanças recentes acirraram o debate entre as posições de esquerda e direita em toda a América Latina — até mundialmente. Isso gerou reações mais acaloradas e, muitas vezes, difíceis de lidar.
No entanto, para os negócios o importante é entender a realidade de modo mais prático, com o objetivo de tomar medidas para minimizar riscos e aproveitar oportunidades. É com essa visão que elaboramos este conteúdo para você.
Com a leitura atenta, você vai ter uma boa ideia do cenário atual, sobre como chegamos até ele e o que esperar para nossa indústria nos próximos anos. Em um momento no qual o setor passa por uma nova revolução, é preciso estar atento ao máximo possível de variáveis de influência. Confira e aproveite!
O presidente eleito na Argentina nas eleições anteriores, Maurício Macri, assumiu o cargo com a promessa de mudar os rumos do país. Até então, eram adotadas políticas ditas intervencionistas, ou seja, nas quais o governo busca ditar o rumo da economia e pretende ser o grande agente de crescimento do país.
Com o PIB em queda, alto desemprego e dívida crescente, a Argentina declarou moratória em 2001. Depois disso, ocorreram novas negociações, mas os credores não aceitaram as condições propostas, gerando processos judiciais de execução e outros problemas para o governo.
Como resultado, o país viu os investimentos desaparecerem, agravando a crise. A proposta de Macri era, justamente, reverter essa política e impor medidas em prol do mercado, ou seja, diminuindo a intervenção, equilibrando as contas e dando liberdade para o mercado agir.
Porém, não foi exatamente o que ocorreu. Logo quando assumiu o mandato, ele impressionou o mercado positivamente com algumas de suas atitudes, mas logo cedeu às pressões, que ocorreram, principalmente, em razão de uma negociação com FMI.
O dirigente argentino conseguiu na época um empréstimo volumoso com a instituição, mas isso gerou descontentamento de grande parte da população, que temia o impacto das medidas de austeridade exigidas para a concessão do financiamento.
A reação de Macri foi flexibilizar sua proposta inicial, o que se mostrou ineficiente em todos os sentidos, tanto para conter o descontentamento dos eleitores, quanto para gerar impacto positivo na economia. Em seu mandato, a dívida cresceu exponencialmente e o problema econômico se agravou, inclusive com crescimento do nível de desemprego — que alcançou os dois dígitos.
Nesse contexto, a oposição voltou ao poder com a promessa de retornar à política anterior, embora, na prática, ela não tenha mudado tanto com Macri. Afinal, muitas das medidas econômicas que ele tomou conflitavam com suas diretrizes iniciais de governo, chegando a implicar em intervenção no mercado de capitais — uma grande contradição em relação à proposta que o permitiu ganhar a eleição.
O Brasil sempre se mostrou um grande parceiro da Argentina, porém ao assumir a presidência, o presidente Jair Bolsonaro atacou duramente o governo Macri, agora eleita.
Declarações favoráveis ao ex-presidente, derrotado nas eleições, geraram certo desconforto. Independentemente do juízo de valor do possamos fazer dessas atitudes, o fato é que, na prática, os políticos sempre adotam duas posturas paralelas de relações internacionais.
De um lado, eles fazem declarações ideológicas para se fortalecerem junto ao seu eleitorado e aos militantes de seus partidos. De outro, negociam como se nada tivesse sido dito, buscando favorecer a economia.
Por isso, poucos acreditam que o desconforto do apoio dado ao ex-presidente Macri possa comprometer de forma definitiva a relação entre Brasil e Argentina — você já vai entender melhor o motivo.
Economicamente, a Argentina é um dos países mais importantes para o Brasil. Além da proximidade, a relação comercial é muito intensa e qualificada. Enquanto exportamos muitos produtos agropecuários e matéria-prima em volume para países como, por exemplo, a China, a Argentina compra carros e outros produtos industrializados — de maior valor agregado.
Em razão disso, há uma dependência mútua entre os países, o que dificulta um rompimento de relações, especialmente nas condições econômicas enfrentadas pelas duas Nações, que precisam se recuperar e voltar a crescer para diminuir o desemprego e equilibrar a situação fiscal.
Em situações delicadas como vive a Argentina é difícil esperar que os novos governos atuem exatamente do modo que prometeram na eleição. Isso ocorre em razão de que, para ganhar o pleito, os políticos precisam convencer os eleitores de que a vida deles melhorará.
Contudo, a realidade de uma economia fragilizada impõe a necessidade de sacrifícios para todos. Ao menos em um primeiro momento, isso é o oposto de uma promessa de recuperação.
Ainda assim, em termos gerais é de se esperar que o governo argentino busque agir de forma mais direta na economia, intervindo de modo mais controlador e limitador. Independentemente dessa expectativa, ele já anunciou as medidas iniciais, que listamos nos tópicos abaixo para você.
A inflação de 55% ao ano corrói o salário dos aposentados argentinos, o que levou o governo a oferecer bônus salariais em dezembro e janeiro. O efeito disso em um país endividado não é muito bom, além de gerar um alívio momentâneo na população, uma vez que tende a aumentar a inflação — se feito em grande volume e por um período mais longo — diminuindo ainda mais o poder de compra do povo.
O novo governo congelou novamente as tarifas de energia. Nesse período, promete elaborar um novo marco regulatório para o setor. Embora essa medida diminua o impacto imediato, os especialistas consideram a intervenção nos preços um grave erro, pois ele funciona como um importante regulador do mercado.
Imóveis com valor superior a 3 milhões de pesos passam a gerar a necessidade de pagamento de impostos de propriedade, com uma alíquota que varia de 0,5% a 1,25% do valor do imóvel.
A política cambial Argentina segue o modelo muito diferente do brasileiro, que, além de políticas cambial e monetária sólidas, fez reformas importantes, como a da previdência. Ou seja, estamos em caminhos diretamente opostos na economia.
No país vizinho, o dólar circula como uma segunda moeda e, nas situações de fragilidade da economia, aumenta a preferência pela moeda estadunidense, desvalorizando a local. Por isso, o governo argentino criou o imposto de 30% para compras feitas em dólares, como passagens aéreas e serviços digitais. O percentual também é devido se a moeda for comprada como investimento.
Uma das promessas de Macri era eliminar o imposto sobre exportação de produtos agrícolas, criado pelo governo anterior de Cristina Kirchner — atual vice-presidente. No entanto, essa foi uma das medidas que ele não completou.
Com o novo governo, as alíquotas devem subir, podendo chegar a 33% no caso da soja e a 15% no do trigo e do milho. Essa medida pode favorecer a exportação de soja brasileira para outros países, uma vez que o produto argentino tende a ficar mais caro. De outro lado, o aumento de imposto sobre o trigo, por exemplo, pode aumentar o preço de derivados produzidos no Brasil, como pão e o macarrão.
Em todo esse processo, o governo chegou a adiar o pagamento de quase 9 milhões de dólares em dívidas, uma das piores medidas que um país pode fazer, pois demonstra um problema de falta de caixa e gera incerteza no mercado, que fica mais resistente em investir.
As agências de avaliação de risco respondem rápida e negativamente. Por isso, muitos fundos de investimento não voltarão a investir no país, uma vez que os seus estatutos impedem que eles sejam destinados a países com baixa classificação — o que também é o caso do Brasil atualmente.
A política de comércio exterior brasileira mudou desde que o último governo assumiu. Fizemos importantes acordos, como com o mercado europeu, mas nenhum deles ainda foi implantado — o que não é um processo simples.
Atualmente, existem divergências sérias entre os novos governos eleitos lá e aqui. Basicamente, o maior impasse deve se limitar a definição do regime de impostos aplicados na região, que impõe altas taxas de importação de outros países para o Mercosul — como forma de proteger o mercado da região.
Ainda assim, nem mesmo esse impasse parece capaz de comprometer a relação entre os dois países. O motivo nós já mencionamos: a enorme dependência econômica entre eles.
Como adiantamos, a indústria brasileira não precisa se preocupar exageradamente com as manifestações ideológicas entre o governo brasileiro e argentino. Ainda que elas não ajudem a melhorar a situação, não parecem indicar que gerarão dificuldades definitivas para o comércio entre os dois países.
Por outro lado, a grave situação econômica do país vizinho e as medidas recentemente adotadas por lá não nos permitem esperar que as reações da economia sejam positivas no curto prazo.
Como o governo atual segue a tendência de atuar fortemente para minimizar o impacto social de uma economia fraca, não podemos esperar a austeridade necessária nesses casos para uma recuperação do quadro fiscal, cambial e das dívidas.
Por isso, embora a parceria entre os dois países deva se manter, independentemente dos políticos, o volume de exportações da indústria brasileira depende diretamente da reação da economia Argentina que, em virtude da instabilidade, não permite um prognóstico muito otimista.
Não parece viável concentrar todas as apostas no comércio com a Argentina e, ao mesmo tempo, não faz sentido negligenciar as possibilidades de negócio com o país vizinho. Um dia a economia começa a se recuperar e, quando isso ocorrer, ele será uma importante oportunidade de crescimento para a indústria brasileira.
Para concluir nossa reflexão sobre a economia Brasil e Argentina, é importante lembrar que a indústria brasileira é bastante competitiva e dinâmica em relação à Argentina. Além disso, declarações do nosso Ministro da Economia, Paulo Guedes, indicam uma abertura comercial gradual, para que a indústria nacional tenha condições de se preparar para uma concorrência mais forte.
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